O amor e o casamento são questões fundamentais que se conectam diretamente à felicidade na vida de uma pessoa. Embora ambos sejam uma questão de escolha, o segundo é frequentemente percebido como mais significativo por ser uma instituição que envolve um sistema de regras e compromissos. Em um mundo onde o debate sobre a diminuição de casamentos e nascimentos é uma pauta social constante em muitos países, incluindo a Coreia do Sul, o filme “Materialistas” chega para jogar luz sobre a complexa paisagem dos relacionamentos modernos.
O longa, dirigido por Celine Song, mergulha nas complexidades do amor na Nova York contemporânea. Embora o cenário seja americano, os dilemas apresentados são universais. Independente da nacionalidade, língua ou cultura, homens e mulheres solteiros recorrem às suas próprias calculadoras internas, pesando os prós e os contras antes de dar um passo tão importante como o casamento.
O Mercado do Casamento: Uma Realidade Nua e Crua
A trama de “Materialistas” gira em torno de Lucy (Dakota Johnson), uma talentosa e bem-sucedida agente de relacionamentos — ou “casamenteira” — que construiu uma carreira de sucesso em Nova York. O mundo profissional de Lucy é um reflexo brutal da realidade: o casamento é tratado como uma espécie de transação, um contrato onde solteiros competem para fechar o melhor negócio possível em um verdadeiro “mercado”.
Nesse mercado, os “requisitos” de uma pessoa se tornam o critério para definir se ela é um produto desejável ou não. Fatores como altura, aparência, salário, e a posse de bens como carro e casa são meticulosamente analisados. Para as mulheres, a beleza e a idade são priorizadas; para os homens, o poder financeiro é o principal atrativo. Esses critérios são convertidos em um sistema de classificação invisível que determina as possibilidades de combinação entre os clientes. Lucy é especialista nisso, analisando os perfis, atribuindo notas e unindo pares compatíveis, já tendo formado nove casais.
O Dilema de Lucy: Riqueza ou Romance?
A própria Lucy, uma mulher solteira em idade de casar, sempre defendeu o lema: “O que importa em um homem é o dinheiro!”. Sua filosofia é posta à prova quando dois homens entram em sua vida simultaneamente. Em um casamento de um cliente, ela conhece o charmoso e extremamente rico Harry (Pedro Pascal), um homem que sua indústria chamaria de “unicórnio” — nascido em berço de ouro e destinado a viver na riqueza. Ao mesmo tempo, ela reencontra seu ex-namorado, John (Chris Evans), um ator que trabalha como garçom para pagar as contas.
Após o primeiro encontro, Harry investe ativamente em Lucy, que começa a sonhar com um futuro dourado ao seu lado. No entanto, uma crise inesperada com um de seus clientes fiéis abala suas convicções e a faz reavaliar seus valores. Esse evento a reaproxima de John, forçando-a a confrontar a dicotomia entre a segurança material e a conexão emocional.
“Materialista”: Um Título, Dois Significados
O título do filme, “Materialistas”, carrega uma dualidade intencional. Sob a ótica capitalista, a palavra descreve alguém focado em bens materiais, muitas vezes com a conotação negativa de “esnobe”. É irônico que o capitalismo, um sistema que prioriza o acúmulo de capital, critique aqueles que adotam plenamente esse valor. Por outro lado, a partir de uma perspectiva marxista, o termo se refere a um “materialista dialético”, alguém que acredita que a matéria e as condições materiais são a base do mundo.
O filme explora ativamente essa contradição para dissecar a essência do “mercado” de casamentos, tentando redescobrir o valor do amor e do matrimônio dentro dele. A diretora Celine Song, conhecida por abordar temas que conhece profundamente, como em seu filme de estreia “Vidas Passadas”, utiliza suas observações sobre o cenário de relacionamentos em Nova York para levantar uma questão central: em um sistema capitalista, o amor pode ser sustentado sem levar em conta o capital?
Do Realismo à Fantasia: Um Final Controverso
Enquanto a primeira metade do filme apresenta uma crítica afiada e um retrato realista do mundo dos relacionamentos, a narrativa eventualmente desvia para o que alguns críticos consideram uma fantasia com um final previsível. A história segue uma convenção do gênero romântico: Lucy, a materialista convicta, acaba escolhendo John, o romântico sem dinheiro. A conclusão parece sugerir que o amor verdadeiro pode, de fato, triunfar sobre as considerações materiais.
Para muitos espectadores contemporâneos, essa conclusão pode parecer antiquada e difícil de aceitar. A ideia de que apenas o amor romântico é suficiente para garantir um casamento feliz é uma noção que soa cada vez mais distante da realidade. O filme, que começa com uma análise cirúrgica da realidade, termina por abraçar uma resolução mais idealista, deixando em aberto o debate sobre sua eficácia.
A Busca Pela Autenticidade em Meio ao Caos
Apesar do final controverso, o questionamento levantado por Celine Song permanece relevante. Em uma era dominada por reality shows de namoro, onde os participantes classificam uns aos outros e as decisões são tomadas com base em critérios superficiais, a busca por uma conexão genuína se torna ainda mais complexa.
Talvez a resposta não esteja em escolher entre um “felizes para sempre” romântico ou uma união puramente transacional. A reflexão que “Materialistas” provoca vai além: em um mundo que tenta quantificar o valor das pessoas, talvez o ato mais revolucionário seja a coragem de ser honesto sobre os próprios sentimentos. A verdadeira força pode não estar em ignorar o mundo material, mas em ter uma convicção emocional tão forte que ela não possa ser abalada pelas pressões do “mercado”.
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